“EXAGERO USAR VERMELHO” – O juiz da 7ª Vara Cível de Teresina, Sebastião Firmino Lima Filho, acatou o pedido de tutela de urgência apresentado (através de seu advogado) pelo governador Wellington Dias e determinou a retirada imediata dos outdoors que o Sindicato dos Policiais Civis de Carreira (SINPOLPI) espalhou pela cidade de Teresina.
LEIA E ENTENDA:
CENSURA E GRANA: W.Dias não aceita crítica em outdoor e corre pra Justiça
Para o magistrado, apesar de Wellington Dias ser pessoa pública e que deva “tolerar as críticas e opiniões contrárias”, o SINPOLPI teria dito na mensagem “A VIOLÊNCIA NO PIAUÍ TEM NOME” que o governador seria responsável por “qualquer ato violento” no estado.
O magistrado também achou exagero a palavra “violência” vir manchada de vermelho. “Há de ser considerado também o apelo visual que possuem os painéis, com a palavra“violência” manchada de vermelho, evidente alusão ao sangue humano.”, escreveu o juiz em sua decisão.
O SINPOLPI pode recorrer da decisão.
DECISÃO NA ÍNTEGRA AQUI:
PROCESSO Nº: 0807813-11.2018.8.18.0140
CLASSE: TUTELA CAUTELAR ANTECEDENTE (12134)
ASSUNTO(S): [Direito de Imagem]
REQUERENTE: JOSE WELLINGTON BARROSO DE ARAUJO DIAS
REQUERIDO: SINDICATO DOS POLICIAIS CIVIS DE CARREIRA DO ESTADO DO PIAUI
DECISÃO
Vistos etc.
Cuida-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER c/c INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS ajuizada por JOSÉ WELLINGTON BARROS DE ARAÚJO DIAS em face de SINDICATO DOS POLICIAIS CIVIS DO ESTADO DO PIAUÍ (SINPOLPI), ambos processualmente qualificados.
Na exordial, alega o autor que teve foto e nome divulgados pelo réu em outdoors espalhados pela cidade, contendo a seguinte informação: “A VIOLÊNCIA DO PIAUÍ TEM NOME”. Que se trata de conteúdo apelativo e inverídico, dando a entender que o autor é responsável pela violência que assola o Estado; que o objetivo do réu é, na verdade, atingir a honra e a imagem do autor, e não de criticar o governo do Estado; que tais publicações ganharam grandes proporções, o que vemcausando prejuízo a honra e a imagem do autor perante a opinião pública.
Requer a concessão de tutela antecipada de urgência para determinar que a parte ré retire todos os outdoors e outros serviços midiáticos com a foto do requerente e o dizer “A VIOLÊNCIA NO PIAUÍ TEM NOME”. Ao final, pugna pela condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais.
É o sucinto relatório. Decido.
Ao tratar dos direitos e garantias fundamentais, a Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso X, preocupou-se em defender a honra e a imagem das pessoas. Por outro lado, os incisos IV e IX da Carta Magna também elevaram à condição de direitos e garantias fundamentais a “livre manifestação do pensamento” e “a liberdade de comunicação”.
Quando tais direitos estão em conflito, deve imperar a técnica de ponderabilidade dos princípios em jogo, a fim de se efetivar a salvaguarda dos núcleos essenciais sem que haja o completo perecimento de um em face do outro. Nesse contexto, pondera-se que o direito de livre manifestação do pensamento e de comunicação, consagrado no artigo 5º da CF, é ferramenta das mais importantesno estado democrático de direito e das mais protegidas.
Exemplo disso é o recente entendimento do Supremo Tribunal Federal quanto a publicação de biografias, ao entender que a necessidade de prévia autorização do biografado seria uma forma de censura, não compatível com a liberdade de expressão.
Merece destaque também a lei que estabeleceu o marco civil da Internet no Brasil (lei 12.965/14), que trouxe como fundamento na disciplina do uso da internet no Brasil, dentre outros, o respeito e a garantia da liberdade de expressão. É o que se depreende do art. 2º da citada lei.
Observa-se, portanto, a força do princípio da livre manifestação de pensamento em nossas leis e jurisprudências frente as demais garantias, quando utilizado de maneira racional, sem exageros.
Portanto, a liberdade de manifestação de pensamento e de opinião deve ocorrer de forma razoável, de sorte que os excessos devem ser prontamente contidos, com o fim ÚNICO de preservar a honra e a imagem das pessoas, independentemente de quem sejam ou do cargo que ocupem.
Dito isso, passo à análise do pedido de tutela antecipada autoral.
Inicialmente, destaco que a tutela provisória de urgência pretendida na inicial se enquadra na espécie de tutela antecipada incidental, prevista no art. 300 do CPC, que visa resolver situação de perigo iminente, na qual o decurso do tempo ameaça o direito material pretendido.
Nos termos do dito artigo, para que seja concedida a antecipação da tutela, devem estar evidenciados a probabilidade do direito alegado e o perigo de dano (tutela antecipada) ou risco ao resultado útil do processo (tutela cautelar).Os requisitos em tela são concorrentes, de sorte que a ausência de um deles inviabiliza a pretensão do autor.
No caso dos autos, entendo que houve excesso no conteúdo divulgado pelos réus nos outodoors espalhados por esta capital. Não pelo fato de ser o autor um agente político (que naturalmente deve possuir tolerância a críticas ou opiniões contrárias), mas pela forma como se deu a manifestação, que atribuiu culpa ao requerente por toda e qualquer ação violenta ocorrida no Estado do Piauí. Há de ser considerado também o apelo visual que possuem os painéis, com a palavra“violência” manchada de vermelho, evidente alusão ao sangue humano.
Óbvio que se trata de manifestação de servidores contra a administração pública estadual, mas que ocorreu de forma desmedida, capaz de atingir, em uma análise perfunctória, a honra e a imagem do autor, além de influenciar a opinião pública perante o requerente. E é nesse contexto que entendo presentes os requisitos ensejadores da tutela de urgência pretendida.
Sobre o tema, destaco os seguintes julgados:
RECURSO ESPECIAL – RESPONSABILIDADE CIVIL – DANO MORAL – DIREITO DE INFORMAÇÃO – ANIMUS NARRANDI – DIREITO A HONRA – DISCUSSÃO VEDADA NESTA SEARA – REEXAME DE PROVA – INADMISSIBILIDADE – SÚMULA 07 STJ – DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL – QUANTUM INDENIZATÓRIO – POSSIBILIDADE DE REVISÃO PELO STJ – VALOR QUE EXTRAPOLA OS LIMITES DO RAZOÁVEL – INEXISTÊNCIA – MANUTENÇÃO DO MONTANTE FIXADO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS – RECURSO NÃO CONHECIDO. A responsabilidade civil decorrente de abusos perpetrados por meio da imprensa abrange a colisão de direitos fundamentais: a liberdade de informação e a tutela dos direitos da personalidade (honra, imagem e vida privada). A atividade jornalística deve ser livre para informar a sociedade acerca de fatos cotidianos de interesse público, em observância ao princípio constitucional do Estado Democrático de Direito; contudo, o direito de informação não é absoluto, vendando-se a divulgação de notícias falaciosas, que exponham indevidamente a intimidade ou acarretem danos à honra e à imagem dos indivíduos, em ofensa ao fundamento constitucional da dignidade da pessoa humana (…)”. (STJ – REsp 818.764/ES Rel Min Jorge Scatezzini DJ 12.03.07).
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE CIVIL. TUTELA ANTECIPADA. RETIRADA DE CONTEÚDO OFENSIVO DE BLOG. DIREITO DE LIBERDADE DE EXPRESSÃO. RESTRIÇÕES PRÉVIAS E RESPONSABILIDADES ULTERIORES. AUSÊNCIA DE DISTINÇÕES ABSOLUTAS. ABUSO DE DIREITO. DIREITO À HONRA. PROVA INEQUÍVOCA DA VEROSSIMILHANÇA CONFIGURADA.1.Para fins de exame da verossimilhança, os documentos juntados ao processodevem ser de tal ordem que sejam capazes de permitir a configuração de um elevado grau de probabilidade para acolhimento da pretensão. 2. Presença do requisito no caso concreto, consistente no abuso do direito de liberdade de expressão em ofensa a direitos personalíssimos dos demandantes, devendo ser reformada a decisão que negou a antecipação dos efeitos da tutela. 3. Possibilidade de o Poder Judiciário emitir ordem judicial para a prevenção de ofensas aos direitos de personalidade da parte agravada. Ausência de distinção ontológica entre restrições prévias e responsabilidades ulteriores. Necessidade de examinar, no caso concreto, a presença de expressões ilegítimas ou não protegidas constitucionalmente, durante o exercício da liberdade de expressão. Verificada a ocorrência do abuso do direito de livre manifestação é possível impedir que os direitos de personalidade continuem sendo violados. (TJ/RS – Agravo de Instrumento nº 70039441878 Relator Desembargador Leonel Pires Ohlweiler, Julgamento em 26/01/2011).
Oportuno destacar que a presente decisão não visa impedir a realização de manifestações ou protestos, mas apenas garantir o pleno direito proteção da honra e da imagem do autor.
Nestas condições, presentes os requisitos mencionados no art. 300 do Novo Código de Processo Civil, DEFIRO o pleito antecipatório para: determinar que a parte ré providencie, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, a retirada dos outdoors contendo a imagem do autor e a frase “A VIOLÊNCIA NO PIAUÍ TEM NOME”, sob pena de multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais) em caso de descumprimento, limitada a dez dias-multa.
Ato contínuo, designo audiência prévia de conciliação para o dia 21 de Junho de 2018, às 9h, nos termos do art. 334 do CPC/15.
INTIME-SE o autor por seu advogado e CITE-SE a parte ré, na pessoa de seu presidente, para se fazerem presentes na data designada, acompanhados por seus advogados, advertindo-os que o não comparecimento injustificado será considerado ato atentatório à dignidade da justiça e sancionado com multa de até dois por cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor do Estado (art. 334, § 8°).
Advirta-se o réu de que o prazo de 15 (quinze) dias para apresentação de defesa se iniciará após a audiência de conciliação, caso não haja composição entre as partes (art. 335, I, NCPC).
Expeça-se mandado de cumprimento e citação.
Cumpra-se.
TERESINA-PI, 24 de abril de 2018.
SEBASTIÃO FIRMINO LIMA FILHO
Juiz(a) de Direito da 7ª Vara Cível da Comarca de Teresina